terça-feira, 31 de dezembro de 2019

App StepPolyArp Unit - muito mais que um mega arpejador

      Mais que um criador de múltiplos arpejadores, o que já seria muito bom, ele pode criar linhas de tipos variados de instrumentos, melódicos, harmônicos, rítmicos, que podem ser disparadas em tempo real por notas tocadas em controlador externo MIDI, sem atraso e sem engasgo, permitindo no iPad funcionalidade bem próxima a de arranjadores automáticos em hardware, isso com ampla e fácil programabilidade, não só para música eletrônica, mas também para estilos regionais brasileiros 

      A informação inicial que achei sobre esse aplicativo, no momento que comecei a usá-lo, me dizia que era um arpejador. Nas programações de fábrica encontrei no máximo alguns arpejos simultâneos para música eletrônica, usando menos do potencial que vi que ele tinha quando estudei melhor seus parâmetros disponíveis de programação. Quando criei o primeiro multi-arpejador no AUM com algumas instâncias do StepPolyArp Unit disparando linhas básicas de drums, bass, piano e brass, enxerguei as possibilidades, que não tinha achado em outros aplicativos musicais arpejadores, não com tanta eficiência e mesmo facilidade de programação. 
      Me senti no início dos anos 1990, quando fazia arranjos nos sequenciadores MIDI, programando playbacks de músicas inteiras para bailes, quando as coisas tinham que ser programadas na mão e do zero. O que aprendi naquela época uso até hoje. Com certeza muito músico mais jovem, acostumado a baixar coisas prontas e de graça na internet, terá que sair de sua zona de conforto para explorar as possibilidades, mas vale a pena. Programar o StepPolyArp Unit é tão recompensador quanto divertido, além de ser muito didático para quem quer aprender a destrinchar estilos rítmicos e criar arranjos instrumentais. 
      Existem muitos arpejadores para iOS, que podem receber programações sofisticadas e controlar via MIDI timbres de outros aplicativos musicais. O app StepPolyArp Unit, contudo, é bem mais que um arpejador. O que é um arpejador? Um arpejador convencional executa notas tocadas num acorde separadamente, em steps e movimentos pré-estabelecidos. Os movimentos tradicionais são de baixo para cima, de cima para baixo, os dois juntos, alternando entre um e outro, além dos modos programáveis onde cria-se sequências variáveis de intervalos. Escalas também pode ser definidas assim como a extensão onde os movimentos serão executados, o comum é abrir notas separadas sobre acordes, por isso o termo arpejo. 

O que há de diferente neste arpejador?

      A primeira coisa a saber é que o StepPolyArp Unit é AUv3, assim várias instâncias suas podem ser chamadas num roteador como o musical app AUM, cada uma enviando notas para aplicativos musicais diferentes ou instâncias AUv3 diferentes de um mesmo aplicativo. Ele não tem um limite (ou pelo menos não é um limite pequeno, de 8 ou 16 arpejos ou instâncias), assim, conjuntos de multi-arpejos, de notas soltas, de acordes, de instrumentos harmônicos ou de peças de kits de baterias, podem ser criados e executados simultaneamente, criando complexas texturas. 
      Ele tem seis modos de arpejos, mais um randômico e um para acordes, dessa forma ele pode ser polifônico, pode repetir o acorde original tocado sem executar um arpejo, propriamente dito. Outro recurso é que podemos escolher qual nota do acorde será executada, assim mesmo que toquemos a 3ª inversão (estado fundamental) de uma tríade maior, só a Tônica, 3ª M ou a 5ª J pode ser executada. Isso é interessante, por exemplo, para criar linhas de instrumentos monofônicos como baixos, isso é feito usando um índice. A partir da nota mais aguda tocada do acorde, as notas são indexadas com números crescentes, assim mesmo que se toque três notas, se usarmos o índice “2” só a segunda nota, no caso de uma tríade maior na 3ª inversão, a 3ª M, que é a 2ª nota do acorde, será tocada. Isso permite criar muitas possibilidades de acordes e de batidas diferentes, a partir de somente um acorde ou notas individuais. 
      A programação principal é feita numa matriz cuja coluna vertical pode ser ajustada por intervalos, por exemplo, -12, -8, -5, -3, -1, 0, +2, +4, +7, +9, +11, +12 etc, ou por tons, por exemplo, C1, C#1, D1, D#1, E1, F1, F#1, G1, G#1, A1, A1#, B1 etc, a partir da referência DO maior. A escolha é feita na tela “Line edit”, acessada pressionando e segurando um dos pontos da coluna vertical, com opções “Relative” para intervalos e “Absolute” para tons. A opção “Relative” cria arpejos que variam de tom conforme as notas são tocadas.
      A opção “Absolute” é interessante para criação de linha de bateria, assim as notas do arpejo programado são executadas indiferente do que se toca no teclado. Dessa forma, enquanto uma nota específica dispara uma linha de baixo no tom tocado por uma instância do aplicativo, em outra instância o bumbo e a caixa fixos em certas notas serão executados juntos. Esse é um recurso que não existe na maioria dos arpejadores cuja falta dificulta programação de bateria junto de instrumentos harmônicos. 
      A coluna horizontal da matriz coloca a nota ou acorde no tempo, que no StepPolyArp Unit pode ser selecionado em passos na tela “Speed”, variando de semibreves até semicolcheias, incluindo tercinas. A escolha da “Speed” aliada ao parâmetro “Lengths”, que define o tamanho do compasso, permite a definição de todo tipo de fórmula de compasso. O uso do parâmetro “Groove” também permite sincopar o ritmo, criando fórmulas de compasso divisíveis por três, como as dos ritmos blues, jazz, shuffle etc. 
     Contudo, um luxo do aplicativo são os parâmetros de expressão, que podem ser programados pela tela “View”, como “Velocity”, “Modulation”, “Pan”, “Volume”, “After touch” e “Bend”. Isso dá vida e dinâmica aos arpejos, trabalhando diretamente com Control Changes MIDI. O tamanho da nota não é limitado pelo “Speed”, pressionando a nota, segurando e depois puxando, pode-se aumentar ou diminuir seu tamanho.
      Além disso, pela tela “Event edit”, acessada pressionando e segurando uma nota, cada nota pode ser minuciosamente editada, como repetições dentro tempo definido pelo “step” (uma semicolcheia pode se transformar em fusas com uma “velocity curve” específica, criando ornamentos como trinados com expressão, crescente ou decrescente de volume). 

iOS e apps para arranjador automático

      Os arpejos do StepPolyArp Unit funcionam bem, os acordes são reconhecidos sem engasgo, assim podem funcionar como um arranjador automático para iOS. Existem aplicativos que geram essa funcionalidade em iOS, como o ORG2020, o One Man Band Live, outros como os arpejadores LayR-Multi Timbral e o RhythmBud AUv3 MIDI FX, esse último com custo mais baixo que os anteriores e ainda assim um arpejador poderoso, todos esses também possuem bons recursos para gerar acompanhamento automático. O Korg iWavestation vem com loops clássicos e tem uma programabilidade fantástica, ainda que complicada, nele uma nota tocada pode disparar várias linhas de instrumentos, mas ele só trabalha com seus sons internos.
      O StepPolyArp Unit, contudo, apesar de não ter timbres internos ou uma tela que simule o painel de arranjadores em hardware, tem muitos parâmetros para programação de arpejos, muitas possibilidades para criação de linhas vivas e ricas sem limite pequeno no número de arpejos simultâneos que o LayR, por exemplo, tem. Ele pode criar um engenho que pode substituir totalmente no iPad um teclado arranjador? Não, deveria no mínimo ter recursos para acionamento rápido de grupos de arpejos diferentes, para simular as “introduções”, “passagens”, “variações”, “finalizações” etc, que os teclados possuem. Nele, hoje, é como se tivéssemos só um grupo de arpejos de cada vez, só o estilo original, sem “variations” ou “fills”.
      Mas por poder criar um número bem grande de arpejos, podemos ligar e desligar essas instâncias, por exemplo, pelo roteador AUM, simulando as variações de estilos que os teclados possuem. Isso pode ser feito com MIDI learn, aliando acionamentos de recursos a controladores externos etc. Ainda que tenhamos que partir do zero nas programações, não há templates de fábrica para isso, digo, não para se emular estilos de teclados arranjadores automáticos, podemos criar templates e fazer novas programações sobre elas, o que facilita bem o trabalho. 

Exemplos de Ajustes


      1. Piano 1 (arpejo): neste primeiro exemplo o uso mais convencional do arpejador (em “Order” está selecionado movimento “up”, de baixo para cima), dessa forma um acorde é tocado e as notas são executadas uma a uma de acordo com o modo e outros ajustes selecionados; no exemplo cada nota do arpejo é executada em cada nota definida na linha horizontal, assim se tocarmos uma tríade maior de DO na inversão fundamental serão tocadas as notas Do, Mi e Sol, da região grave para a aguda, repetidamente, se começar do Do, quatro notas caberão num compasso, Do, Mi, Sol e Do novamente, na velocidade definida em “Speed”. 


      2. Piano 2 (acorde): com o modo acorde selecionado (última opção três barrinhas em “Order”) o acorde tocado é executado com as notas juntas, sem arpejo; veja que nesse exemplo foram definidas notas nos tempos fortes, assim se notas forem tocadas nos tempos fracos só serão reconhecidas no próximo tempo forte, é importante fazer a programação mais adequada para tocar determinada música, ainda que tenham uma mesma “batida”, mudanças mais rápidas ou mais lentas de acordes podem não executar o resultado desejado. 


      3. Baixo 1: neste exemplo só uma nota é executada (as notas estão marcadas com números, não com os símbolos “=“, “>”, “>|” etc), desse jeito ainda que um acorde de duas, três ou mais notas seja tocado, no exemplo, a de índice “1”, a 1ª nota mais aguda do acorde é que será executada nos três primeiros tempo e a 3ª nota, índice “3”, no quarto tempo; esse ajuste é interessante para linhas de baixo, lembrando que é preciso escolher a inversão melhor de acorde para tocar para que a nota que queremos que seja o baixo seja escolhida, no exemplo, como a 1ª; a 4ª nota do exemplo está com o índice “3”, que será, quando uma tríade na inversão fundamental for tocada, a 5ª justa, a nota que geralmente é usada para intercalar com a Tônica em linhas de contra-baixo.


      4. Baixo 2 (transpose): uma variação do exemplo anterior, mas usando um recurso que parece simples, mas que é poderoso no StepPolyArp Unit, foi usado o mesmo índice na 4ª nota, o índice “1”, mas transpondo-a “-5” meios-tons (veja que ela está numa linha vertical diferente), isso faz com que o DO, 1ª nota de uma tríade maior na inversão fundamental, seja transposto cinco meios-tons para baixo, tornando-o em SOL, que é a 5ª J de DO, assim como no exemplo anterior a 5ª J ainda será executada, mas informando isso de outra maneira para o arpejador; lembrando que a programação é sempre feita usando uma escala como referência, nos exemplos aqui, DO maior (isso pode ser ajustado no parâmetro “Scale”). 


      5. Brass 1: como no exemplo anterior, não é o acorde total tocado que é executado, mas só as notas dele com índices selecionados e reconhecidos, nesse exemplo foram marcados índices “2” e “3” na mesma nota (linha vertical “+0” foi repetida para a mesma nota receber índices diferentes), assim se tocarmos uma tríade maior em inversão fundamental só a 3ª M e a 5ª J serão executadas, a 2ª e a 3ª notas; veja que foi usado o modo 1 de arpejo, não o modo acorde, é isso que permite a execução só de notas selecionadas pelos índices; entenda que se uma nota for tocada, só uma nota será executada, ela mesma, como o arpejador não reconhece os índices “2” e “3” ele toca uma nota e pronto; mas se duas notas forem tocadas será executada a segunda, já que ele reconhece o índice “2”; para que duas notas sejam executadas é preciso tocar três ou mais notas, para que sejam reconhecidas os índices “2” e “3”. 


      6. Brass 2 (transpose): neste exemplo também só serão executadas as notas selecionadas, mas foi repetido o índice “1” com transposição diferente, em linhas verticais distintas, assim basta uma nota para gerar duas notas, uma idêntica à tocada e uma segunda, transposta “+7” meios tons acima, portanto se um DO for tocado um DO e um SOL serão executadas; esse ajuste é econômico, basta uma nota para executar duas, e ainda que várias sejam tocadas, só duas serão executadas, sempre; para foi usado o modo de arpejo “1”, assim são tocadas no máximo duas notas, mas se for usado o modo acorde (três barrinhas) serão executadas duas notas para cada nota do acorde tocada, usando sempre a referência do transpose, dessa forma se um DO e um MI forem tocados serão executadas um DO, um SOL (o DO transposto “+7”), um MI e um SI (o MI transposto “+7”). 


      7. Drums: nos exemplos anteriores somente o “Line edit Relative” foi usado, assim as notas executadas variam de acordo com o tom das notas tocadas, mas neste último exemplo foi usado o “Line edit Absolute”, ideal para kits de bateria; esse recurso permite que programemos as peças de bateria pelas notas que aparecem no kit, contudo, o disparo dessa linha é feito quando qualquer nota for tocada, não havendo alteração de tonalidade; repetindo, isso funciona bem quando muitos arpejos forem tocados ao mesmo tempo, baixo e piano, por exemplo, variando conforme o tom e notas indexadas, mas a bateria só sendo disparada, sem alteração de tom. 

Vídeos com programações de estilos para arranjador automático no iPad



      Na lista acima, vídeos com estilos, como de teclado arranjador automático, gerados pelo musical app StepPolyArp Unit no musical app AUM. Acordes tocados no teclado Waldman Krypton 25 com ajustes pelo controller Worlde Easycontrol.9 disparam os estilos em tempo real, o áudio dos vídeos não são playbacks. O StepPolyArp Unit reconhece o acorde e cria várias linhas de instrumentos de outro musical app. Tenho usado o Bismark bs-16i por ser GM, leve e com qualidade eficiente para a finalidade, mas qualquer app pode ser usado. 
      Os estilos são programações originais, baixe-os neste link: se preciso, pode ajusta-los ao teclado usado alterando as oitavas dos instrumentos, para facilitar é mais conveniente fazer isso nos apps de instrumentos (ou no fluxo do AUM), não no StepPolyArp Unit. Os estilos dos vídeos podem ser melhorados, principalmente os regionais brasileiros por programadores com mais experiência neles, mas eles podem ser usados como templates iniciais. A intenção é mostrar que o aplicativo pode gerar o recurso de arranjador automático em iOS mesmo em ritmos brasileiros. 


LINKS:


Matéria originalmente publicada na revista Teclas& Afins, edição de dezembro de 2019
José Osório de Souza - #músicosqueusamipad 

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